Por: RUBENS MUZIO (www.sepal.org.br)
"O crescimento das igrejas é
um fenômeno complexo."
Ocorre em níveis distintos e de
diferentes maneiras. Devemos aguardar que a igreja cresça? É normal crescer?
Devemos antecipar o crescimento como sinal da presença do reino de Deus e
considerar sua expansão como critério para medir nossa fidelidade missionária?
Ou devemos conceber o crescimento da igreja como um dom recebido com elogio e
gratidão, mas não esperado? Sem dúvida, a preocupação com o crescimento da
igreja está na mente da maior parte dos líderes evangélicos.
Você provavelmente ouviu falar
que os evangélicos alcançaram a marca de 22,02% da população no censo do IBGE
em 2010. Em 1970, a população evangélica girava em torno de 4,8 milhões de
fiéis. Em 1980, os evangélicos representavam somente 6,6% (7,9 milhões) dos
brasileiros. Em 1991, a igreja avançava a barreira dos 13,7 milhões e em 2000,
acima de todas as previsões estatísticas, a igreja ultrapassou os 26 milhões de
adeptos! Durante a década de 90, a velocidade de crescimento da igreja
evangélica foi quatro vezes maior que a da população brasileira. Chegamos a um
contingente de mais de 42 milhões de pessoas espalhados pelos quatro cantos do país
que se identificam como evangélicos. O crescimento numérico na década atingiu
61%.
Você percebe que os católicos
perfaziam quase 92% da população em 1970? Entre os anos 2000 e 2010, os
católicos perderam milhões de adeptos, diminuindo de 73,75% para 64,63% da
população. Mas os católicos não foram os únicos a encolherem. Reconhecemos que
o crescimento foi impressionante e sua velocidade fenomenal. Enquanto no
hemisfério norte muitas igrejas morrem diariamente ou são transformadas em
museus, escolas e clubes, no Brasil, milhares de igrejas continuam a dar sinais
que o crescimento numérico ainda não chegou ao fim. Algumas igrejas que
apresentaram considerável crescimento entre 1991 e 2000 retraíram. A Igreja
Universal do Reino de Deus (IURD) perdeu aproximadamente 229.000 participantes,
a Igreja Presbiteriana (somando todas as denominações – IPB, IPI, IPR, IPU)
perdeu cerca de 59.800 membros, a Igreja Congregacional perdeu 39.245 membros e
a Igreja Luterana (em todas as suas expressões – IECLB e IELB) perdeu cerca de
62.600 membros.
É verdade que ao voltar nossos
olhos para a história da igreja no livro de Atos dos Apóstolos, encontramos
vivas descrições de crescimento naqueles primeiros dias. Em Atos 2:41, três mil
são adicionados à igreja. Logo depois, em Atos 4:4, o número de discípulos sobe
para cinco mil. Em Atos 6:1 e 7, os crentes continuar a crescer rapidamente. Em
Atos 12:24, sabemos que a prisão e libertação de Pedro fez com que a Palavra de
Deus crescesse e multiplicasse. A preocupação com a vida dos pagãos era uma das
grandes forças por trás da pregação do evangelho. Havia um sentimento de
urgência energizando profundamente a todos os discípulos.
Entretanto, uma revisão moderada
e sóbria de todas as páginas do Novo Testamento revela pouco interesse no
crescimento numérico. Há uma absoluta falta de estatísticas das igrejas locais.
Além disso, as referências aos milhares descritos em Atos 2, 4 e 21, não podem
ser tomados em termos exatos. Elas apenas demonstram um crescimento enorme e
veloz numa pequena área do globo e numa cultura específica, limitando-se
principalmente ao Império Romano e suas áreas adjacentes. Temos realmente
poucas informações dos métodos utilizados, os quais não preveniram o
aparecimento de heresias como o gnosticismo e o donatismo. Os métodos do
primeiro século também não anteciparam a grave corrupção da igreja na idade
Média. O problema da “numerolatria” - a dependência excessiva dos números - foi
apontado por Charles Van Engen no livro The Growth of the True Church (O
crescimento da verdadeira igreja). Apesar de afirmar que o Novo Testamento tem
abundantes provas de interesse pelo crescimento numérico, Van Engen sugere que
somente o desejo e não a pressão pelos alvos do crescimento numérico se
justifica como um sentimento válido.
As epístolas de Paulo e Pedro
igualmente não demonstraram acentuado interesse no crescimento. Não os
encontramos preocupados em registrar o número de seus participantes, visitantes
e membros. Sua principal preocupação está na fidelidade do discípulo e na
integridade de seu testemunho, a fim de que o evangelho seja pregado, os
gentios se convertam e sejam santificados pelo Espírito Santo (Rm. 15:15-19). Pedro
anima todo cristão a se preparar prontamente e responder gentilmente quando sua
esperança em Cristo for desafiada. (1 Pt. 3: 15). No texto de Rm 15:17-23,
Paulo afirma ter pregado o evangelho desde Jerusalém até Ilírico e portanto não
havia mais espaço para trabalho nestas regiões. Obviamente ele não está dizendo
que todos os habitantes daquela região ouviram o evangelho, se converteram e
tornaram-se membros de dúzias de igrejas localizadas em todas as ruas e
avenidas, como nos dias de hoje. Considerando o que sabemos sobre a teologia
pastoral de Paulo, ele estava lembrando que igrejas foram plantadas nestas
regiões como primícias, dádivas aos gentios. O nascimento delas era o fruto de
seu trabalho. Quando a comunidade cristã começasse a existir, seu trabalho
estaria concluído. Outros poderiam chegar e edificar sobre a fundação, como
Apolo (1 Co 3:5-15). Paulo sentia que sua missão estava concluída sempre que
houvesse uma comunidade que reconhecesse Jesus Cristo como supremo Senhor da
vida. Ele entregava toda a responsabilidade para a liderança local e logo
partia para outra cidade sem criar vínculos financeiros com as novas igrejas.
Mais importante de tudo talvez seja o fato que Paulo não impunha sobre eles
nenhum tipo de visão ou ministério, nem os treinava para a multiplicação de sua
estrutura missionária ou denominacional. Não encontramos nem tanta ansiedade
nem tanto entusiasmo diante do crescimento numérico, mas sim uma constante
preocupação com a integridade do evangelho.